terça-feira, 3 de maio de 2016

Crítica: "O Décimo Homem"

O Décimo Homem
(El Rey del Once)
Data de Estréia no Brasil: 05/05/2016
Direção: Daniel Burman
Distribuição: Buena Vista Internacional


     "O Décimo Homem" é um filme de baixo orçamento argentino que acompanha os passos de Ariel, antigo residente do bairro de Once, uma comunidade judaica em Buenos Aires, que volta para sua terra natal para apresentar sua noiva Mônica à seu pai, Usher. De certa forma, o filme segue uma estrutura de road movie ao tirar seu personagem principal da zona de conforto em que se encontrava, trabalhando como ecônomo em Nova York, e o transpor para novas situações fruto de um novo ambiente. O mais interessante sobre a premissa de "O Décimo Homem" é o fato de que essa situação em que Ariel se encontra não é algo inteiramente novo, mas o local onde passou sua infância e há muito não retornava. O que se dá então é um estudo de personagem, analisando uma semana da vida de Ariel em Once, lidando com reminiscências de seu passado e o momento atual de sua vida.
         O desenvolvimento da trama de "O Décimo Homem" é gradual, mas de forma alguma lento. Os primeiros momentos do filme já servem para estabelecer uma complicada relação de Ariel com seu pai, que até os momentos finais do filme só aparece como uma voz ao telefone. Há uma cena particularmente interessante neste primeiro ato, em que Ariel remonta alguns momentos de sua infância. Algumas coisas importantes são aqui estabelecidas: a definição que ele faz dele e de seu pai como pessoas que se preocupam mais em planejar algo do que realmente fazê-lo; a ausência da figura de sua mãe, que é uma constante ao longo de todo o filme; a definição que faz posteriormente de ter sido este o momento, aos 10 anos, em que resolveu se desvincular da tradição judaica de sua família, quando seu pai decide por não ir em uma cerimônia importante para Ariel porque foi chamado para ser o "décimo homem" que faltava para completar o número necessário para realizar um enterro.
        Este último ponto é de suma importância para o restante da trama, pois é o principal tema que perpassa toda a narrativa de "O Último Homem". O conflito geracional entre Ariel e seu pai, agravado pela relação distante entre os dois, é explorado em tela com oposições entre elementos desta nova vida de Ariel em Nova York com o Once de sua infância, demonstrado por exemplo no confronto entre sua mentalidade capitalista e o altruísmo da associação judaica que seu pai comanda, ou na frieza e falta de empolgação com que trata seu relacionamento com Mônica em contraste com a sua visível alegria em passar tempo com Eva. Aqui funciona muito bem o elemento do filme de marcar bem a passagem de tempo a partir dos dias da semana, nos permitindo acompanhar melhor as transformações na personalidade de Ariel e demarcar suas contradições ao longo dos dias.
         E um sentido mais técnico, "O Último Homem" é uma execução perfeita da proposta do roteiro. As atuações são todas muito boas e estão em consonância com os personagens e a ideia geral do filme. Já Daniel Burman consegue encontrar para seu filme um estilo visual que é desde o começo muito condizente com a essência da história. Vale ressaltar o contraste entre os enquadramentos de câmera ao começo do filme, sempre mostrando Ariel tomando todo o plano, como que completamente isolado do que o cerca, e os enquadramentos mais para o final, que mostram tomadas mais abertas, enfocando sua interação com o cenário e os outros personagens. Em dado momento, chama a atenção do público quando a câmera parece "perder" Ariel em meio às pessoas que o cercam em um jantar da associação.
        Se ressalto o filme por sua perfeita execução, também o critico por não ir além disso. Entendo que havia momentos no roteiro que poderiam ser melhores aproveitados com um pouco mais de subjetividade visual e uma comicidade que aparecem de forma tímida e pouco frequente. Porém, de maneira geral "O Décimo Homem" acerta muito ao mostrar uma história ao invés de contá-la, utilizando-se muito bem da narrativa daquela semana da vida de seu personagem para explorar sua personalidade sem depender de muitos diálogos e interações com outros personagens para fazê-lo. "O Décimo Homem" é um filme que claramente pretende transmitir uma ideia, ressaltando uma noção de família patriarcal e tradicional de auxílio mútuo entre seus membros, uma ideia de comunidade, e o executa de maneira precisa e muito interessante.


Ótimo

Por Obi-Wan

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