quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Crítica: "Demônio de Neon"

Demônio de Neon
(The Neon Demon)
Terror(?)/Suspense(?)/Nada(?)
Data de Estreia no Brasil: 29/09/2016
Direção: Nicolas Winding Refn
Distribuição: California Filmes



         Nicolas Winding Refn é um pornógrafo! Criando filmes que visam apenas provocar o espectador (aparentemente, o excepcional “Drive” foi um exemplo mais controlado disso) o cineasta de origem dinamarquesa é sem dúvida alguma um dos diretores mais talentosos esteticamente na atualidade, criando composições e lógicas visuais impressionantes - a partir de milhares de técnicas narrativas -, mas que sempre possuem um toque exibicionista e exagerado ao tratar de maneira gráfica e fetichizada tudo o que envolve sexo e violência – Inclusive, a afirmação a qual abri meu texto é do próprio Refn. Assim, após defender o dinamarquês por seus quatro últimos filmes (sim, aprecio até mesmo o tão criticado “Apenas Deus Perdoa”) me vejo na obrigação de afirmar que sua auto-indulgência chegou a seu ápice, ultrapassando qualquer limite do aceitável com este “Demônio de Neon”, que consegue ser uma obra impactante em seus aspectos técnicos, mas completamente vazia (e por vezes reprovável) em seu conteúdo.
         A narrativa se dá através de algo que parece uma história, mas é apenas um ponto de partida para que Refn componha seus quadros a partir de luzes lancinantes e sequencias oníricas numa evocação clara, e falha, a David Lynch. Acompanhamos Jesse, uma aspirante a modelo que acaba de chegar a Los Angeles chamando muita atenção por sua beleza estonteante e completamente natural. A garota acaba atraindo inveja e desejo para a sua direção, algo que dá ao espectador a idéia de que em algum lugar de “Neon Demon” há intenções de criticar a superficialidade fetichista do mundo da moda, o que é uma proeza hipócrita gritante já que estas são justamente as qualidades que o próprio filme possui. O filme, assim, desenrola sua pouca história de forma extremamente lenta por dois fatores: uma edição que em certos momentos se estende e pela própria técnica do seu realizador por trás das câmeras.
         Dessa forma, é importante ressaltar que embora Winding Refn faça um trabalho minucioso em técnica, isto não o restringe de críticas em sua abordagem. Não há como negar que a deculpagem das cenas foi feita de forma minimalista, mas Refn parece tão apaixonado por suas imagens que as estende a partir de longos travellings e panorâmicas extremamente lentos, contando ainda com um uso demasiado e irritante de câmera lenta que ainda denuncia o fetiche pela violência e pelos corpos de suas atrizes que o diretor possui. Embora cumpra com perfeição as tarefas de aspectos plásticos que cabem a um diretor, Refn é sabotado por sua arrogância ao acreditar que seus simbolismos não só são o centro da narrativa (o que desloca todos os personagens para o status de meras figuras cenográficas), como também que estes possuem algo muito importante a dizer.
         A verdade, que os realizadores aparentemente não perceberam, é que é justamente em seus simbolismos e metáforas que o filme acaba por perder o espectador. Querendo brincar de Stanley Kubrick, o dinamarquês aposta no impacto de suas imagens para apresentar a aparente relevância de seu filme, sem constatar que estas possuem significados extremamente rasos, o que parece depor para um conhecimento simplório dos roteiristas (Refn junto de Mary Laws e Polly Stenham) sobre o mundo que querem retratar. Ao contrário do mestre de "2001", as imagens não são profundas em sua reflexão - e Kubrick, em 68, já mostrava que a direção certa para tais simbolismos estava justamente na comunicação de todos os aspectos de um filme e não simplesmente na aniquilação de uma história em detrimento de impacto imagético –, sendo, na verdade, por muitas vezes machista e de um mau gosto terrível. (E RECOMENDO QUE NÃO LEIA O PRÓXIMO PARÁGRAFO CASO NÃO TENHA VISTO O FILME!)
         A própria transformação da protagonista ocorrida na metade do filme, além de ser extremamente forçada e abrupta, reforça um estereótipo doloroso de que aquilo se dá quando a garota se entrega a sua feminilidade (egocêntrica e competitiva, na perspectiva dos realizadores) ao desfilar na passarela em direção a um triângulo invertido, que é o símbolo do “feminino”, e que passa do azul para o vermelho, numa transição que denota a sua entrega a cor do desejo e da vaidade. Se nesse ponto o filme está nos mostrando a protagonista abraçando a sua sexualidade e egocentrismo (ela chega a beijar sua imagem num espelho), é alarmante o fato de que a partir disto ela logo se torna uma pessoa fria com seu amigo fotógrafo que, apaixonado por ela e tendo ajudado-a em um momento difícil, agora é meramente desprezado por Jesse. Some a isso o fato de que o desejo sexual irrefreável de Ruby (Jena Malone em atuação segura) é retratado com um caráter de periculosidade, já que é o impulso para a sequencia de perseguição e canibalismo na mansão, além a tentativa da personagem de forçar Jesse a transar com ela e da sequencia necrófila, e pode se ter uma ideia do que o filme tem a dizer sobre o desejo sexual das mulheres.
         Como já é de praxe num filme de NWR, a fotografia (obra de Natahsa Braier) em “Demônio de Neon” é impecável, com as variações certas de iluminação que trazem o peso onírico desejado, ao passo em que também revela as texturas e jogo de luz completamente artificial e que evoca o aspecto de “neon” até mesmo em lâmpadas simples, revelando-se um deleite para os olhos. O filme conta ainda com uma trilha sonora caótica que aposta na combinação eletrônica dos mais variados instrumentos musicais (ouve-se sintetizadores, flautas e guitarras, por exemplo.) que se por vezes soa cafona e invasiva – são poucos os segundos de silêncio no filme – pelo menos revela-se também completamente proposital. É sintomático que o filme de Nicolas Windin Refn como um todo deixe um gosto amargo ainda com sua objetificação de suas atrizes, mesmo que isto também se revele aparentemente proposital não é menos repulsivo e criticável a quem aborda a antropofagia do mundo da moda com tamanho olhar pornográfico.





Por Han Solo
Ruim

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